terça-feira, novembro 21, 2006

Neptuno



As nuvens sobre o mar eterno, a distância ao nosso alcance ou o céu na palma da tua mão, como uma bola de cristal. Sinto a maresia através do vácuo, a espuma fria que se solta das vagas. Ouço o refluxo da onda e os seixos a rolar como um tremor de terra. E vejo-te, meu amor, através do espaço e do tempo.

sexta-feira, novembro 03, 2006

Dia dos Mortos

Ontem foi o dia dos mortos, dia de finados, fiéis defuntos, chamem-lhe o que quiserem. Depende mesmo daquilo que se pretende realçar. Um morto é um não-alguém, alguém que foi e já não é. Um finado é alguém que chegou ao fim, há aqui uma dificuldade em aceitar a cessação do ser. Um defunto (de de-functu) é alguém que deixou de desempenhar a sua função, aqui a perspectiva é fria e racional, objectiva mesmo.
Eu gosto mais de dizer dia dos mortos, tudo o resto me soa a artifício para não o dizer deste modo.

Foi nesse dia funesto que nasceu Teixeira de Pascoaes, envolto na sombra do Marão, banhado pela água fria do Tâmega, perdido em contemplação na ponte de S. Gonçalo...

O melhor é deixá-lo falar...

«Poeta

Quando a primeira lágrima aflorou
Nos meus olhos, divina claridade
A minha pátria aldeia alumiou
Duma luz triste, que era já saudade.

Humildes, pobres cousas, como eu sou
Dor acesa na vossa escuridade...
Sou, em futuro, o tempo que passou-
Em num, o antigo tempo é nova idade.

Sou fraga da montanha, névoa astral,
Quimérica figura matinal,
Imagem de alma em terra modelada.

Sou o homem de si mesmo fugitivo;
Fantasma a delirar, mistério vivo,
A loucura de Deus, o sonho e o nada.»

Teixeira de Pascoaes