segunda-feira, outubro 03, 2005

Eclipsa-me

Eclipsa-me os sentidos, a mente, o corpo. Eclipsa-me este querer, esta ânsia de devorar o mundo! Eclipsa-me os que não falam com verdade e os que se apressam para o mal. Eclipsa-me o mar e a última onda do dia, a espraiar-se solitária numa praia deserta... Eclipsa-me essa onda, especialmente, para que não me lembre que há beleza tão imensa que desfaz toda a tristeza do mundo. Porque hoje quero sentir-me triste. Porque hoje, quero sentir-me nas profundezas aquáticas da melancolia.
Eclipsa-me, só hoje, para que me possa demorar nos pântanos e na charneca, e me possa sentir triste. Para que possa vaguear na penumbra, como uma alma perdida. Para que possa comer com os mortos e rir, sentado à sua mesa. Para que dos meus lábios não tenha de sair uma só palavra, só hoje. Só hoje, um eclipse que me oculte assim, subitamente. Um eclipse que fosse maior do que o mundo e, ao partir, deixasse a verdade a brilhar, luzidia, nos olhos das pessoas. E não houvesse mais mentira.

1 comentário:

Anónimo disse...

Texto muito bonito.
"...deixasse a verdade a brilhar, luzidia, nos olhos das pessoas. E não houvesse mais mentira."
Bonita procura espiritual :) muito parecida com a minha :)